Minas é o segundo Estado no ranking nacional
de intoxicações por agrotóxicos. O dado consta em relatório publicado pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e revela que as notificações
por aqui cresceram mais de 300% de 2007 a 2015. No período, mais de 13 mil
casos foram contabilizados.
O
aumento vai de encontro a um projeto de lei de autoria do deputado federal Luiz
Nishimori (PR), do Paraná, que pretende flexibilizar o uso dos defensivos
agrícolas em todo o país. O texto propõe, dentre outras medidas, a troca do
termo “agrotóxico” por “produto fitossanitário”.
Além disso, a proposta inicial visava
concentrar a autorização para a venda dessas substâncias apenas no Ministério
da Agricultura. Hoje, é preciso passar pelo crivo da Anvisa e do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) antes de
a comercialização ser permitida.
Porém,
especialistas alertam que, caso o projeto seja aprovado, os prejuízos à saúde
da população podem ser incalculáveis. Toxicologista da Unidade Técnica de
Exposição Ocupacional do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Márcia Sarpa
afirma que inúmeros estudos já associaram a exposição aos agrotóxicos a vários
tipos de doenças.
Nocivos
A
pesquisadora explica que as pessoas podem ter intoxicações agudas, que
ocorrem depois do contato com grandes quantidades desses produtos em um curto
período de tempo, ou crônicas, que é a forma mais comum, depois de pequenas
exposições aos agrotóxicos ao longo de muitos anos.
Nesse
último caso, os efeitos afetam os sistemas imunológico e endócrino, causando
até mesmo a desregulação hormonal. “Na prática, o longo contato pode adiantar a
puberdade em adolescentes, provocar abortos, crianças com malformação,
infertilidade masculina e até câncer”, explica Márcia.
Hoje,
vários defensivos banidos da agricultura de diversos países continuam sendo
usados no Brasil. Para a toxicologista, a mudança proposta pelo projeto de lei
pode aumentar a insegurança alimentar de milhares de pessoas. “Essa medida quer
estabelecer limites aceitáveis para agrotóxicos proibidos. O problema é que,
para essas substâncias, não há dosagem segura”.
Fiscalização
No
Estado, 1.530 marcas de defensivos têm autorização do Instituto Mineiro de
Agropecuária (IMA) para serem comercializadas. Dentre os vários tipos no
mercado, o herbicida glifosato é o mais utilizado. Não por acaso, o produto
também está relacionado à maior parte dos casos de intoxicação por aqui,
segundo a Anvisa.
Milho, soja, feijão e algodão
são os cultivos que mais utilizam as substâncias em Minas
O
uso de agrotóxico em Minas é mais comum nas plantações de milho, soja, feijão e
algodão. Esses cultivos são, também, os que ocupam as maiores áreas de plantio
do Estado.
Conforme
o IMA, cerca de 840 fiscalizações são feitas por mês, tanto em áreas urbanas
quanto rurais. Multas são aplicadas ao se constatar a utilização de substâncias
proibidas ou com manejo incorreto. Em 2017, 22 autos de infração foram
registrados.
Por
nota, a Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef) se posicionou
favoravelmente à “modernização” da lei e defendeu ser possível o uso do produto
de forma segura.
Já
o deputado Luiz Nishimori destacou que uma das principais inovações da proposta
é a inclusão do critério de avaliação de risco em complemento à análise de
perigo utilizada hoje para novos produtos. “Significa que, quando manuseados
corretamente, aplicados em quantidade, frequência e prazos adequados, os
defensivos não oferecem riscos à saúde”.
O autor do projeto de lei diz que o registro de agrotóxicos
continuará sendo analisado pelo Ibama e pela Anvisa
Sobre
a alteração da nomenclatura para produtos fitossanitários, o parlamentar
informou que “este é um detalhe que pretende colocar o Brasil em consonância ao
que é praticado em outros países”.
Agroecologia é aposta dos
órgãos de saúde para pôr fim ao uso de produtos nocivos
A
agroecologia é apontada, por órgãos de saúde de todo o mundo, como a principal
alternativa para os agrotóxicos. A prática consiste em desenvolver cultivos sem
a utilização de veneno, combatendo pragas apenas com recursos naturais.
Em
um dossiê que reúne dezenas de estudos sobre o tema, a Associação Brasileira de
Saúde Coletiva (Abrasco) defende que o agronegócio, nos moldes atuais, é
insustentável e pode gerar impactos ambientais irreversíveis a longo prazo.
Além
dos reflexos diretos na saúde humana, o uso das substâncias pode contaminar
mananciais, um prejuízo que demandaria técnicas muito mais complexas para ser
compensado.
Substituição
Biólogo
e membro do grupo temático Saúde e Ambiente da Abrasco, Fernando Carneiro
explica que pesquisas da Organização das Nações Unidas (ONU) já demonstraram
que a agroecologia tem potencial para substituir por completo o cultivo
mecanizado e a dependência dos defensivos agrícolas. “Já está provado que o
método pode alimentar o mundo. O que falta são políticas de incentivo”.
Em
Minas, um grupo ligado à Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
(Emater) atua no fortalecimento da agroecologia. Edmar Gadelha, responsável
pelo projeto, afirma que o desafio é vencer a resistência do modelo de cultivo
dominante.
“Queremos
trabalhar com a melhoria da fiscalização, que precisa ser ampliada e tem
limitação de pessoal. Mas também com a educação, o estímulo às práticas
alternativas e o aprimoramento da legislação sobre o tema”, explica.
Além disso: É possível se
proteger?
Não
há como evitar o impacto dos agrotóxicos na saúde apenas lavando bem os
alimentos, uma vez que as substâncias estão dentro dos grãos, frutas ou legumes
que utilizam os defensivos durante o cultivo. A afirmação é da toxicologista do
Instituto Nacional do Câncer (Inca), Márcia Sarpa.
Apesar
de a higiene ser uma prática essencial para evitar danos à saúde, ela explica
que o melhor a se fazer para minimizar o problema é procurar produtos da época.
“Esses geralmente têm uma carga menor de agrotóxicos”, explica. Outra
indicação, segundo a especialista, é dar preferência a vegetais orgânicos que,
na maioria dos casos, são vendidos em feiras e cultivados por pequenos
produtores.
De
acordo com o Ministério da Saúde, colocar os alimentos mergulhados em uma
solução de hipoclorito de sódio (água sanitária) com água por 15 minutos é a
forma mais eficaz de se higienizar verduras, frutas e legumes.
Fonte: Hoje em Dia.
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