quinta-feira, 28 de junho de 2018

Mel diminui efeito cáustico da ingestão de pilhas botão

"Além disso, antes do tratamento deve-se considerar a história clínica de doenças que contraindicam o uso dessas substâncias, como a alergia grave ao mel ou ao sucralfato, e o fato de a criança ter menos de um ano de idade, devido ao pequeno risco de botulismo infantil associado ao mel”.

Foto: Ciave-BA
O mel pode diminuir o risco de lesões graves resultantes da ingestão da pilha botão (bateria redonda ou pilha moeda), e deve ser administrado o mais rápido possível, e repetidamente, após a ingestão da pilha, mostrou pesquisa.

Usando modelos de animais vivos e de cadáveres animais, Rachel R. Anfang, MA, da Divisão de Otorrinolaringologia do Children's Hospital of Philadelphia, na Pensilvânia (EUA), e colaboradores, avaliaram o efeito protetor do mel, bem como de bebidas comuns com baixa acidez, e do sucralfato, utilizado contra úlceras, nas lesões cáusticas causadas quando uma pilha botão entra em contato com a mucosa esofágica. Tanto o mel quanto o sucralfato diminuíram a descarga da bateria, neutralizaram o aumento do pH na mucosa no local de contato da bateria atingindo níveis considerados clinicamente ideais e protegeram contra as lesões profundas de mucosa, relatam os autores em um estudo publicado on-line em 11 de junho no periódico The Laryngoscope.

As lesões por pilha botão têm se tornado cada vez mais comuns e mais graves, tanto porque essas baterias redondas estão em quase todos os pequenos aparelhos eletrônicos atuais, quanto porque a última geração delas é ainda menor e mais poderosa do que nunca, explicam os autores.

“Mais de 3.000 ingestões de pilha botão são notificadas anualmente nos Estados Unidos. Embora isso represente uma pequena parte da ingestão de corpo estranho por crianças, a pilha botão contribui para a piora do problema por seu sério risco de morbidade e mortalidade”, escreveram.

“Houve um aumento de 5,8 vezes nas lesões graves, e um aumento de 12,5 vezes dos desfechos fatais de 2006 a 2017 comparados ao período de 1994 a 2005”.

Crianças com menos de seis anos de idade, atraídas pela aparência brilhante e pela semelhança com balas ou doces das pequenas baterias, correm maior risco de ingestão, observam Rachel e colaboradores.

Para investigar as possíveis opções de redução dos danos durante o intervalo entre a ingestão da bateria e a remoção endoscópica dela, os pesquisadores avaliaram o efeito de neutralização do pH de soluções viscosas fracamente ácidas na evolução da irritação no esôfago de cadáveres de leitões e no esôfago de leitões vivos, fazendo verificações antes do contato com a pilha botão e após a remoção dela. Nos experimentos in vitro, os cortes de esôfago foram expostos a cada 10 a 15 minutos a diversos tipos de substâncias: mel, sucralfato, suco de maçã, suco de laranja, vários repositores energéticos, xarope de ácer, saliva artificial e controle com cloreto de sódio a 0,9%. No estudo in vivo, foram feitas irrigações seriadas a cada 10 minutos via laringoscópio com soro fisiológico, suspensão de sucralfato (1 g/10 mL), ou mel (Pure Clover Honey™ , Gunter) durante um período de 60 minutos, durante o qual a bateria permaneceu no lugar.

A análise dos cortes anatômicos in vitro mostrou que somente o mel e o sucralfato neutralizaram o aumento do pH da mucosa no local de aplicação da bateria a níveis considerados clinicamente ideais e estatisticamente significativos em relação ao controle com soro fisiológico.

“Isso se manteve verdadeiro quanto à capacidade de diminuir a gravidade das lesões na mucosa das peças anatômicas”, informam os autores, observando que o tecido tratado com soro fisiológico manteve o pH muito alcalino e causou maior lesão tecidual.

Resultados semelhantes foram observados no estudo in vivo. “O mel foi mais eficaz do que o sucralfato, e ambos foram significativamente melhores do que o soro fisiológico em retardar a descarga da pilha botão e em neutralizar o aumento do pH da mucosa”, informam os autores.

E embora não tenham havido diferenças significativas na região da superfície da úlcera nas amostras in vivo, a gravidade da lesão diferiu substancialmente. “Metade dos animais de controle evoluíram com perfuração esofágica tardia, enquanto nenhum animal tratado com mel ou sucralfato apresentou essa complicação grave”, observam os autores. “A avaliação dos cortes anatômicos corados com hematoxilina e eosina revelou profundidades significativamente maiores de necrose, e havia tecido de granulação cicatricial em níveis significativamente mais profundos entre os controles do que nos dois grupos de tratamento”.

A mucosa dos controles também mostrou destruição mais extensa da camada muscular profunda do esôfago, afirmam os autores.

“Curiosamente, o tecido lesado não estava na região diretamente abaixo da mucosa da superfície ulcerada. Todos os grupos apresentaram destruição da camada muscular estendendo-se além da lesão visível na superfície, com grau significativamente maior encontrado no grupo de controle”.

Outras análises mostraram necrose de coagulação mais extensa e lesão muscular com o soro fisiológico, e fibrose de reparação com colágeno mais densa nas regiões de lesão grave com mel e sucralfato.

Esses achados sugerem que a extensa lesão na camada muscular profunda adjacente para além das pequenas margens da úlcera mucosa leva ao colapso estrutural do tecido na região da úlcera, que por sua vez leva a “perfurações surpreendentemente grandes com extensão externa mínima da lesão muscular externa”, escrevem os autores.

“Este estudo destaca o aumento do risco que o grupo controle tem de evoluir com lesões perfurantes e outras complicações graves de uma lesão por pilha botão. Comparativamente, o mel e o sucralfato foram eficazes em reduzir a progressão da lesão, alterando o padrão de lesão para um padrão mais favorável".

Dado o risco de impactação esofágica da pilha botão – podem ocorrer sérias lesões, como perfuração esofágica, paralisia das cordas vocais e erosão das vias respiratórias ou dos grandes vasos sanguíneos, nas duas primeiras horas após a ingestão – os autores sugerem a intervenção precoce com mel ou suspensão de sucralfato em caso de ingestão de bateria, suspeita ou testemunhada.

“Deve-se ter cautela em casos de diagnóstico tardio ou de ingestão em estágio avançado, para os quais já existe suspeita clínica de perfuração, mediastinite ou sepse”, escrevem os pesquisadores.

"Além disso, antes do tratamento deve-se considerar a história clínica de doenças que contraindicam o uso dessas substâncias, como a alergia grave ao mel ou ao sucralfato, e o fato de a criança ter menos de um ano de idade, devido ao pequeno risco de botulismo infantil associado ao mel”.

A dose e o volume ideais de mel ou sucralfato podem ser avaliados em estudos futuros, mas a frequência e dose usada neste estudo (10 mL ou duas colheres de chá a cada 10 minutos) são uma referência razoável, escrevem os autores. Em termos de uso, eles acrescentam que “a opção do mel é para uso doméstico e destinada a ser utilizada até que a criança possa chegar a uma unidade de saúde. Uma vez na unidade de saúde, o sucralfato pode ser utilizado até a remoção da pilha botão”.

O financiamento deste estudo foi feito com bolsa do Children's Hospital of Philadelphia Frontiers Program, da Filadélfia. Os autores revelam manter relações com as empresas Intertek, Marpac Inc, e com as organizações National Button Battery Task Force, American Academy of Pediatrics e a American Bronch-Esophagological Association. Os autores informaram não possuir conflitos de interesses .

Fonte:  The Laryngoscope.

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